quinta-feira, 29 de maio de 2008

Entrevista com Pedro Pondé - Ultima parte!


A internet tem constituído a principal ferramenta de divulgação de bandas independentes. Como você vê esse fenômeno?
Eu vejo que é a ferramenta que a gente tem... Mas você não pode jogar todas as expectativas pra internet, você precisa fazer show. Acredito que o show é a maior divulgação que uma banda tem. Ao mesmo tempo, você não pode tirar o crédito da internet e dizer que ela não funciona, porque funciona demais.

Como é sua relação com os fãs?
É bastante íntima. Mas eu não gosto de chamar de fã, prefiro chamar de admirador. Fã parece fanatismo, uma coisa que talvez não faça muito sentido no trabalho que a gente se propôs a fazer. A gente trabalha com uma coisa que no teatro chamam de “quebrar a quarta parede”. Não tem aquele negócio de fingir que tem uma parede entre você e o público e você curtir a luz, o som e esquecer que tem gente ali. É justamente o contrário, o principal ali é o encontro do seu som com aquelas pessoas. E eu também admiro vários artistas, vou ao show deles, procuro prestar atenção e quando eu percebo que algum deles olhou pra mim, me sinto envaidecido. Então eu procuro ser o mais íntimo possível. Mesmo no palco, procuro olhar no olho. E eu odeio canhão de luz, ele cega o artista, que não consegue ver ninguém. Gosto de descer, abraçar, conversar. Só no Orkut eu sou meio lento e preguiçoso, porque eu não tenho intimidade com computador e para digitar sou uma porcaria. Me sinto mal às vezes, porque várias pessoas falam “você é estrela, não responde” e eu digo “ô, foi mal, me desculpe”.

Em outros estados, como é a receptividade do público?
Em cada lugar é diferente. Em Brasília, a gente foi num lugar mais alternativo e a galera curtiu bastante. Em outro lugar, que era mais elitizado, nem achei que tinha muito a ver, a cultura era totalmente cover... Nada contra, mas quando você chega num lugar em que não vê uma banda tocando música própria e você tem um repertório todo autoral ou de versões totalmente diferentes de músicas de outras pessoas, você acaba assustando. Mas o que eu mais gosto é de sair daqui pra assustar também.

Como você vê os estilos axé, pagode e arrocha?
Há uns dez anos, eu tinha uma visão altamente radical. Preconceito tanto com a música axé, pagode ou arrocha, quanto com o público, uma coisa bem imbecil que eu tenho que assumir que tinha. Então fiz um trabalho que não tinha a ver com música com vários “axezeiros” e “pagodeiros”, uma galera bastante animada. Pela galera, eu comecei a perder o preconceito com o tipo de música. Mas eu ainda tenho preconceito com manipulação de massa. O problema não é a música, é a manipulação que se faz com esses tipos de música. Porque não é justo você não dar à população educação, alimentação e saúde, e querer colocar entretenimento no lugar de coisas básicas. A mídia, também, procura vender fácil. E o que é mais fácil vender? A alegria, emoção que se absorve logo. Tanto é que nas propagandas o que mais se vê é o sorriso. Então eu acho que alguns empresários se utilizam da cultura popular e acabam transformando numa coisa pejorativa, para poder lucrar mais e isso acaba sufocando o que o povo cria de mais bacana. Por exemplo, o samba de roda é uma coisa autenticamente baiana. Existem várias formas de dominar a massa, inclusive através da música, e eu não concordo com isso. Mas eu não tenho nenhum preconceito com o ritmo axé ou pagode. Acho que deve existir música pra alegrar também. Só não respeito a forma como o mercado se utiliza disso e sufoca várias outras formas de arte em benefício próprio.

A música “A Rochinha” tem relação com isso?

É, talvez com essa falta de preconceito que a gente tenha com o estilo. Porque várias pessoas que trabalham a semana toda no camelô saem de casa no fim de semana com o teclado, se sentindo o Roberto Carlos, e é a noite deles serem estrelas no Abaeté. Então Israel fez uma música espontaneamente, brincando com um teclado antigo de Tadeu, o produtor, e gravou a “A rochinha” sem saber. Então Tadeu contou a história de um cara que toca teclado no Abaeté e a gente começou a pensar nisso e resolvemos por a música no CD...

Da banda, qual é sua música predileta e por quê?
Um Bravo, porque foi uma música que eu fiz no mesmo mês que eu saí da Scambo, fui expulso da casa que eu morava e perdi minha mãe... Morei num quartinho de zelador na Pituba, e me chamavam de burguês por causa do bairro, mas ninguém sabia que era num quartinho de zelador, com um bocado de escorpião. Eu dormia e acordava no terror quando um fio e cabelo encostava em mim, achando que era escorpião. E tive que ser um bravo ali. Eu tinha um desespero de querer continuar fazendo música e não me dobrar a esse sistema de ser obrigado sempre a fazer o que não suporta o tempo todo só pra sobreviver. Eu prefiro que a dificuldade venha pra eu aprender e acordar, não me render às facilidades e perder minha identidade. Acho que Um Bravo fala sobre isso: pode estar tudo contra você e você vai ter força pra levantar.

Como você analisa a cena alternativa baiana?
É uma cena (risos). Rapaz, eu fui a Recife e eu fiquei besta porque eu vi o carnaval de lá e os artistas de lá, no palco principal, eram aplaudidos entusiasticamente pela população. Vi Nação Zumbi tocando para milhares de pessoas e todo mundo cantando todas as letras com um orgulho enorme daquilo e eu fiquei extremamente emocionado. Antes de eu morrer, se eu conseguisse ver 5% daquilo que eu vi aqui em Salvador, eu ia morrer feliz. Porque eles realmente se valorizam e aqui em Salvador a gente não se valoriza muito. Aqui você não tem espaço pra crescer. Todos os locais são muito pequenos, não há lugar de médio porte. Acho que não tem mercado aqui, ou seja, as bandas não conseguem viver do trabalho musical que fazem e isso é ruim porque acaba frustrando os artistas. Aqui em Salvador também tem a mídia mais voltada pro axé, pro pagode, o que é até natural também, porque eu não posso chegar em Nova Iorque e esperar que lá tenham quarenta e cinco capoeiristas e quinhentas bandas de axé. Aqui o mercado do axé é absurdamente grande e movimenta milhões, então é uma realidade, eu tenho que entender que Salvador é um lugar que tem mais recurso para esse tipo de música. Agora não é o tipo de música que eu quero fazer, então não posso ficar tão frustrado, se eu já tenho esse entendimento. Eu devo tentar fazer meu trabalho aqui e expandi-lo para que a gente possa um dia conseguir viver do que a gente faz, pelo menos. Ao mesmo tempo em que o mercado não existe pra música alternativa, os que conseguem se manter fazendo sua arte não têm nenhuma obrigação com o mercado e isso deixa a arte desses totalmente livre e mais autêntica. Se você vai a São Paulo, onde há mercado para banda alternativa, as bandas já crescem pensando no que é que o mercado compra ou quer. Então você vê quinhentas bandas iguais. Aqui, você vai a quinhentos lugares diferentes e vê o mesmo número de bandas diferentes.

Para fechar, que mensagem você deixa para as bandas alternativas que estão começando?
Ter persistência, fibra... E se sentir que não é sua onda, caia fora logo, não perca tempo porque tem que ter raça mesmo. Então, goste muito do que você ta fazendo, senão vá fazer outra coisa. Porque isso é pra quem ama...

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